O Mundo tem-no como brasileiro, mas Jorvan Vieira garante que se sente acima de tudo português. Um português de Lousada. O treinador que conduziu a selecção iraquiana ao título asiático, no último mês de Julho, veio passar uns dias à casa que tem em Boim, concelho de Lousada.
Falou com o Maisfutebol e contou tudo o que sente nesta altura em que se tornou subitamente mediático.
A começar por essa pouco conhecida ligação a Portugal. «Só viajo com passaporte português», garante.
Ele que é filho de pais português e mãe brasileira, que nasceu no Rio de Janeiro e que só descobriu Portugal quando em 92 foi convidado a treinar o Macedo de Cavaleiros. «Não tenho nada contra o passaporte brasileiro, mas foi uma opção que fiz. Em todos os países em que trabalhei apresento-me como cidadão português, vou à embaixada e faço a minha inscrição consular», acrescenta. «Inclusivamente as credenciais que uso ao peito durante as competições e os jogos dizem Jorvan Vieira – Portugal».
Dentro de dois anos é em Portugal que quer viver o resto da vida. Para já, porém, a ordem é aproveitar a fama que o título asiático com a frágil selecção do Iraque lhe trouxe. «Já tinha tudo organizado para nos instalarmos aqui definitivamente em Dezembro, a minha esposa já tinha pedido a reforma antecipada, foi-lhe dada e estava tudo pronto. Só que com o título asiático muitas coisas mudaram e eu tenho que aproveitar as propostas que estão a surgir, até pela minha estabilidade financeira».
Em cima da mesa estão convites das selecções da Coreia do Sul e da China, na cabeça de Jorvan Vieira está o sonho de estar no Mundial da África do Sul em 2010.
A guerrilha interna no grupo e o título pela paz do povo iraquiano.
Para trás ficou o título asiático pelo Iraque. Um título que parecia impossível num país onde o campeonato dura apenas três meses e que se realiza apenas no norte, que é nesta altura mais pacífico. «Mas eu sabia que podia chegar a algum lugar. Tanto que na primeira reunião com os meus jogadores, entreguei-lhes um dossier com a organização do trabalho de toda a campanha que na última página dizia 29 de Julho, final em Jacarta», conta.
«Quando viram a última página eles olharam, levantaram a cabeça e olharam para mim a pensar que eu era maluco. Eles próprios não acreditavam que fosse possível chegar à final e ganhar o título».
Acabaram por chegar e com isso ser campeões asiáticos. No final de um longo trabalho psicológico. Em todos os sentidos. Num país flagelado pelas mortes e pelos atentados, juntar xiitas, sunitas e curdos foi um aventura. «Quando começaram o estágio nem se falavam. À mesa, por exemplo, os xiitas só se sentavam com xiitas, os sunitas com sunitas e os curdos com curdos.
Quando chegámos ao treino não passavam a bola a colegas de outra etnia». Jorvan teve de unir o grupo. «Comecei por arranjar uma mesa ao comprido em que eles ficassem de frente uns para os outros. No primeiro dia não se olharam, comeram sem levantar a cabeça. Mas com o tempo isso foi mudando».
O treinador teve um longo trabalho psicológico, inclusivamente juntava jogadores de etnias diferentes no mesmo quarto. «Falei muito com eles, em grupo e individualmente, disse-lhe que tinham a obrigação de jogar bem pelo povo iraquiano e consegui que eles realmente fizessem um grupo».
No final foi mesmo pelo povo iraquiano que jogaram. «O título deu muita alegria às pessoas, muita paz ao povo. Acho que foi uma forma de reduzir a violência. Tive oportunidade de conviver com os iraquianos e sei que são pessoas boas, pessoas humildes, mas muito bravas, que já sobreviveram a três guerras consecutivas e que gostam muito do país deles».
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