Campeão da Copa da Ásia pelo Iraque em 2007, o treinador brasileiro Jorvan Vieira cravou seu nome no país de Saddam Hussein e virou uma figura tão popular quanto os sucessores do presidente-ditador. Por diversos motivos. O simples fato de ter aceitado treinar uma seleção em um lugar que vivia um contexto absurdamente violento já o tornava ‘herói’. Ele também tinha a difícil missão de unir jogadores e torcedores curdos, xiitas e sunitas, colocando suas diferenças de lado, para por um momento, servir de alegria ao país. Uma inimaginável missão bem sucedida que serviu de lição para os próprios políticos locais.
Em 2007, o Iraque estava tomado por tropas norte-americanas. Um ano antes, condenado por crimes cometidos contra a humanidade o presidente-ditador Saddam Hussein foi condenado à forca. Venerado por alguns que elogiavam sua postura de oposição aos Estados Unidos, Hussein se destacou mesmo por uma ditadura brutal. Grupos de direitos humanos apontam que mais de 250 mil iranianos foram mortos ao longo de suas duas décadas de regime.
Devastados por uma guerra que sequer tinha um vislumbre para um fim, o que se via em ruas iranianas à aquela altura eram inúmeros soldados norte-americanos e alguns violentos grupos paramilitares iraquianos. A Guerra ao Terror era real. Em julho daquele ano, a ONU anunciou que houveram 1.057 mortos em conflitos.
Apesar de todo esse violento cenário, Vieira se destacava. Tudo bem que pegou uma equipe que já havia sido quarto lugar nas Olimpíadas de 2004, mas o contexto geopolítico não ajudava. Mas o que se vi a partir do momento em que assumiu a seleção iraquiana foi uma força aglutinadora e aos poucos a união do povo iraquiano, afinal de contas, o pesquisador Saad Eskander, à época diretor da Biblioteca Nacional do país em entrevista à Folha de São Paulo pontuou que os iraquianos são, “como os brasileiros”, apaixonados por futebol.
Vieira em uma incrível campanha e sem nenhuma derrota conduziu o Iraque ao título da principal competição de seleção da Ásia e conseguiu fazer algo que a Organização das Nações Unidas não havia atingido: organizar a inimaginável união entre jogadores curdos, sunitas, xiitas e pacificar a equipe para a competição. “É por isso que teve sucesso, […] porque todos os iraquianos -crianças, homens e mulheres- gostam de Vieira”, afirmou Eskander na mesma entrevista concedida à Folha. “É uma esperança. Todos os iraquianos, independentemente de religião ou origem, comemoraram a vitória juntos. Todos dançaram e cantaram nas ruas. Não é uma distração. Os iraquianos, como os brasileiros, gostam de futebol -e adoram o bom futebol”, pontuou.
O título fez do brasileiro a figura mais mais popular do Iraque. “Mais do que o presidente [Jalal Talabani] e o primeiro-ministro [Nuri al-Maliki].” Sua condução no futebol fez com que as pessoas pedissem para que os políticos seguissem o exemplo de Vieira. “Os iraquianos criticam os políticos e pedem que sigam o exemplo da seleção”, ressaltou. “O que une os iraquianos é o futebol. A seleção iraquiana tem jogadores curdos, sunitas, xiitas, mas o técnico brasileiro conseguiu fazer o time trabalhar como uma unidade”, concluiu.
Talvez o Brasil precise de uma pessoa como Jorvan Vieira para conduzir o país, no contexto polarizante que vivemos. Ou quem sabe, conciliar conflitos entre curdos, xiitas e sunitas seja algo um pouco mais tranquilo de se conduzir…
Texto: Domingos Ketelbey, Diário de Goiás