Foi contratado por dois meses e em dois meses apenas Jorvan Vieira colocou o mundo a falar do Iraque por outra razão que não as guerras, os atentados ou as mortes. A frágil selecção iraquiana sagrou-se campeã asiática. Um título que até há pouco tempo parecia utópico num país onde o futebol apenas é jogado no norte, que é menos violento, onde o campeonato dura três meses e onde os jogadores locais nem têm um salário fixo, sendo a maior parte das vezes pagos em luvas, comida, roupas ou medicamentos.
O mundo tem-no como brasileiro, mas Jorvan Vieira diz ser português. Um português de Lousada. «Quero treinar mais dois anos no estrangeiro», garante, ele que parece destinado a orientar a Coreia do Sul até ao Mundial 2010. «Depois disso vou para Portugal e é lá que quero viver o resto da minha vida. Tenho nacionalidade brasileira, marroquina e portuguesa, mas sou sobretudo português. Ando sempre com o passaporte português e as credenciais que utilizo nos jogos dizem Jorvan Vieira – Portugal.»
A forma como fala, aliás, denuncia-o. Refere-se aos “caras” como “gajos” e tem aquele jeito bem português de colocar um pá no final de cada frase. «O meu pai é português, a minha mãe brasileira, nasci no Rio de Janeiro, mas já não vou ao Brasil há oito anos. Vou agora receber uma condecoração do Governo, mas vou pedir à minha mãe para ir lá por mim.» Não é lá que se sente em casa. Ele que se tornou muçulmano já adulto «por uma questão de equilíbrio emocional» que a criminalidade do Rio coloca em causa.
Por isso diz que Brasil nunca mais. Casado com uma marroquina, espera juntar-se à mulher e ao filho de dez anos, que actualmente estão em Marrocos, para se instalar definitivamente em Lousada. «Tenho lá uma casa, em Boim, e é para lá que vou sempre que tenho um tempo. Passo lá todos os natais e as passagens de ano. Gosto de ficar lá com as minhas plantas e as minhas galinhas, junto dos meus primos. É lá que me vejo em breve. Se der para continuar a trabalhar, nem que numa divisão inferior, óptimo.»
Jorvan tem até um sonho, orientar o Penafiel. «Uma vez já esteve perto de acontecer, nos anos 90, até fui lá ver um jogo com o presidente. Mas houve porrada, tivemos que nos esconder e a minha mulher disse logo que ali nem pensar. Talvez agora seja possível». Afável e simpático, despede-se pedindo o telemóvel e jurando que em breve dá um salto a Portugal. «Quando chegar dou um toque», diz. «Conhece o Caçador, em Lousada? Não? Então temos que ir lá almoçar. Tem o melhor naco do Mundo.»
As condecorações
A importância da vitória com o Iraque transcende em muito o futebol. Jorvan Vieira é agora chamado de embaixador da paz. Vai ser condecorado no Iraque, no Brasil e até em Espanha, onde se preparam para lhe entregar o título de «Príncipe das Astúrias». A conversa com o DN é interrompida quatro vezes. «Peço desculpa», diz. «Nestes dias o telefone não tem parado. Querem que vá a França, a Espanha, a Marrocos». Mas Jorvan Vieira não se coloca em bicos de pés. «Continuo a ser a mesma pessoa. Vou viver este sonho enquanto dura, mas sei que ele não me vai mudar nada.»|
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